ANTÔNIO TORRES: SEU FILÓ 'NECESSIDADE E GANÂNCIA'

ANTÔNIO TORRES: SEU FILÓ 'NECESSIDADE E GANÂNCIA'
Antônio Novais Torres

Por Antônio Novais Torres


Seu Filó, dito Filomeno, sexagenário alquebrado pelos anos de trabalho árduo no campo, velho sisudo, sério e honrado, veio para a cidade, por indicação, para trabalhar como vigia noturno em uma revenda de automóveis. Como sempre, Seu Filó chegou pontualmente às 18 horas, pegou o relógio de ponto – coleira de cachorro, como ele o chamava – e passou a exercer o seu trabalho. Porém, vivia a reclamar do minguado salário. Mesmo acrescido do adicional noturno, não dava para atender às necessidades da família numerosa. Precisava da ajuda da mulher que, mesmo doente, lavava roupa de ganho para ajudar o marido nas despesas da casa. Com prole numerosa e ganho insuficiente, Seu Filó pediu ajuda à diretoria da empresa onde trabalhava e conseguiu empregar um de seus filhos como office-boy. Rapaz esperto, logo dominou o macete do trabalho. Comunicativo, conquistou a simpatia e a confiança de todos.

Por Antônio Novais Torres

 

Seu Filó, dito Filomeno, sexagenário alquebrado pelos anos de trabalho árduo no campo, velho sisudo, sério e honrado, veio para a cidade, por indicação, para trabalhar como vigia noturno em uma revenda de automóveis.

 

Como sempre, Seu Filó chegou pontualmente às 18 horas, pegou o relógio de ponto – coleira de cachorro, como ele o chamava – e passou a exercer o seu trabalho. Porém, vivia a reclamar do minguado salário. Mesmo acrescido do adicional noturno, não dava para atender às necessidades da família numerosa. Precisava da ajuda da mulher que, mesmo doente, lavava roupa de ganho para ajudar o marido nas despesas da casa.

 

Com prole numerosa e ganho insuficiente, Seu Filó pediu ajuda à diretoria da empresa onde trabalhava e conseguiu empregar um de seus filhos como office-boy. Rapaz esperto, logo dominou o macete do trabalho. Comunicativo, conquistou a simpatia e a confiança de todos.

 

Direito e sério, a exemplo do pai, era merecedor de confiança. Certo dia, ao fazer depósito e pagamentos diversos em determinado banco, deparou-se com um pacote na área reservada para os clientes fazerem depósitos e outras atividades. Não percebendo ninguém por perto, resolveu abri-lo e constatou que se tratava de dinheiro (uma grana preta). Diante desse fato, resolveu entregar o pacote ao gerente do banco. Este imediatamente telefonou para a empresa, fez elogios à virtude do office-boy e da sua consciência ao devolver ao banco o que não lhe pertencia. Por essa atitude honesta do garoto, sugeriu à firma fazer melhor aproveitamento do funcionário, dando-lhe maiores oportunidades.

 

Às 18 horas, como de costume, chega Seu Filó com sua mochila às costas, e os funcionários fazem-lhe o relato do ocorrido, elogiando a atitude honesta do menino, um exemplo a ser divulgado e que muitos não teriam essa consciência de atitude honrada. Diante dessa notícia, retornou imediatamente a casa e deu uma surra no filho que precisou ser levado ao hospital. Interrogado pelo acontecido, o velho se explicou: “Esse moleque sabe que estamos passando por dificuldades, somos necessitados. Eu trabalho de vigia noturno e a mãe, mesmo doente, lava roupa de ganho para ajudar nas despesas da casa, e o menino acha uma dinheirama dessas e entrega ao gerente do banco, homem rico e não precisado”. O corretivo foi injusto.

 

 Mas como se vê, mesmo sério, honrado e direito, a situação financeira agravante pode desvirtuar o caráter do indivíduo, menos convicto dos valores morais e éticos. Foi o que aconteceu com Seu Filó.

 

Recentemente a mídia divulgou que um funcionário do alto escalão de uma empresa financista deixou-se levar pela tentação e a ganância ilícita para se enriquecer, dando um golpe financeiro na firma. O resultado foi que perdeu o emprego de muitos anos, a confiança nele depositado e a maior virtude do ser humano – a dignidade.

 

A sociedade impõe regras e valores que levam o indivíduo a encarar o dinheiro como a solução para os seus problemas – ledo engano –. Assim Filó entendeu, em sua visão canhestra, e vergastou o filho que praticara um ato de honestidade.

 

Ser pobre não significa ser desonesto, e o vigia trocou os valores éticos e morais pela causa da necessidade orçamentária. Já o funcionário da empresa financeira, conforme divulgou a mídia, ao ver a possibilidade de enriquecer-se ilicitamente, usou desse artifício para se locupletar e terminou punido pela inconsequência do seu ato que representou a ganância de obter vantagem de forma incorret


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